A Procissão Eu quero me vestir de anjo! - Disse a menina ruiva, na época com não mais do que seis anos de idade. - Mas porque esta vontade agora minha filha, você nem gosta de andar muito, toda vez que saímos seu pai tem que te carregar, você vive chorando. Assim respondeu a mãe para a teimosa filha. Mais mãe – disse a menina, quero uma roupa de anjo bem branquinha com brilho e a coroinha de três estrelas. Mãe – você me compra um tercinho também? Minha filha a procissão vai por aquela subida você não vai agüenta andar nem a metade – uma vez mais advertiu a mãe. Mãe – você me compra os sapatos brancos também? A menina estava com idéia fixa – queria se paramentar de anjo. Percebendo que não adiantaria mais dar o contra e pensando também no valor espiritual do ato, a mãe enfim concordou com o pedido. Levou a menina até a costureira para fazer a túnica de cetim branco e a faixa azul celeste do mesmo tecido. O par de asas e a coroinha foram comprados no dia seguinte. Uma semana antes da procissão a roupa ficou pronta. A partir de então, todos os dias a menina experimentava a vestimenta contando os dias para enfim realizar o desejo. Os sapatos – Mãe você não vai me comprar os sapatos brancos? Indagou a menina. Com tantos afazeres a mãe acabou por procurar na última hora os sapatos a fim de complementar a vestimenta. Chamou a filha e ambas se dirigiram á uma sapataria do bairro. Passava das cinco da tarde. A menina teria que estar em frente à igreja – lugar de saída da procissão no máximo até as seis e meia. Logo, encontrariam os sapatos brancos naquela loja ou teria que ir com os usados – coisa que a menina não aceitava. Senhora, no número que a menina calça tem somente estes dois pares na cor branca – disse a vendedora. A menina calçava na verdade número trinta e dois. Ao examinar os sapatos antes da filha provar a mãe observou que ambos os pares marcavam o número trinta. Normalmente é assim, se a loja não tem o número no modelo solicitado tenta empurrar o menor sob o argumento de que com o tempo de uso o couro cede... - Filha escolhe outra cor, estes não servem para você – disse a mãe. - Senhora experimente na criança, o fabricante desta marca usa formas grandes, com certeza serve para a menina. Os minutos transcorriam rapidamente, tinham horário para estar na igreja não poderiam demorar na escolha. - Mãe quero experimentar estes aqui cheios de furinhos e florzinha do lado, indicou Lara – este era o nome da criança. Lara preste atenção são pequenos para você – escolha outro modelo, outra cor, olha só como ficaram apertados você esqueceu da subida que vai ter de andar a pé? – Uma vez mais advertiu a mãe. - Mãe eu quero estes, disse a teimosa menina já em tom choroso. Vendo que não tinha mesmo jeito, comprou para a filha o par de sapatos brancos com furinhos e florzinhas dos lados, dois números menores. Chegaram em casa. A menina correu para se vestir, estava deslumbrada. Enfim o sonho seria realizado. Sairia no cortejo religioso vestida de anjo com as asinhas de pena e a coroa com três estrelinhas. Calçou o par de meias soquete e os sapatos, pegou o tercinho e lá se foi com os pais para porta da igreja de onde sairia a procissão. Não demorou quase nada, bastou a menina andar um quarteirão para a mãe perceber que esta caminhava com dificuldades - obvio em razão dos sapatos apertados. O soar dos sinos indicaram que o cortejo sairia em poucos minutos. A mãe, sempre preocupada com a filha se colocou o mais próximo que pode a fim de observar. Na descida do percurso a menina se manteve firme segurando o tercinho e a vela acesa. A cantoria religiosa se revezava com orações – era dia da padroeira. Após íngreme descida – a igreja se situava no topo de colina, os fieis foram conduzidos para o retorno – hora da subida. Lara demonstrava sinais de dor nos pés em razão dos sapatos apertados. Não demorou para se esquecer da vestimenta angelical e sem a menor cerimônia chorar copiosamente. Os fiéis enfileirados logo atrás do cortejo de anjos dentre os quais se encontrava a menina com os sapatos apertados prestavam atenção no berreiro. A mãe percebendo o sofrimento tentava falar baixinho para a menina tirar os sapatos. Que nada, mesmo chorando seguiu até o final o cortejo, calçando o par de sapatos dois números menores. Na benção final, fogos espocaram iluminando o céu estrelado. Lara, sentou-se em um dos degraus da igreja adormeceu sob o olhar dos pais, sem tirar os sapatinhos. Recebeu colo no longo trajeto de volta. O pai deitou-a na cama, enquanto que a mãe tirava os sapatinhos brancos com furinhos e florzinhas do lado. Nos pés bolhas - uma semana de molho sem poder ir ao colégio. Satisfeita contava a todos a proeza, a realização do sonho de se vestir de anjo - túnica branca de cetim, faixa azul celeste, coroinha com três estrelas, tercinho e os desejados sapatos brancos comprados na última hora dois números menores. Toda vez que fala no assunto, (muitos anos se passaram), relembra a conquista do sonho em se vestir de anjo e cumprir o ptrajeto da procissão até o fim calçando os sapatos apertados. No cotidiano às vezes as situações se assemelham ao propósito da menina Lara. Quando se tem um objetivo a disciplina e a determinação são fundamentais para alcançá-los. (Ana Stoppa ) Ana Stoppa
Enviado por Ana Stoppa em 02/02/2011
Alterado em 17/02/2011 Copyright © 2011. Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor. |