O Casaco Vermelho
Edileuza, quer vender-me este casaco? Perguntou Silvia para a antiga conhecida, uma bela jovem contando a época dos fatos com os seus vinte anos de idade. - Mas eu uso não quero me desfazer- respondeu a moça vestida com um suntuoso casaco de lã vermelho, para a adolescente apaixonada pela peça. Mesmo não estando à venda - insistiu a jovem, quando não o quiser mais você me vende? Está bem disse Edileusa, quando eu não quiser mais venderei para você. Na época - meados dos anos sessenta não eram comuns os brechós. Somente as pessoas que se conheciam faziam este tipo de negócio. Silvia uma adolescente com quinze anos sonhava com o tal do casaco vermelho. Vivia se imaginando vestida com a peça, torcia para que a dona se desfizesse, queria curtir o inverno desfilando de casaco vermelho. No final do ano, uma vez mais se encontrou com Edileusa, quando perguntou sobre o casaco. Olhe Silvia , disse Edileusa, tem tanto tempo que você me pede o casaco que resolvi te fazer um presente. Passa lá em casa amanhã, pois será minha folga – a moça trabalhava como balconista em uma farmácia da capital. Na manhã seguinte, uma quarta-feira de dezembro, logo cedo Silvia foi em busca do sonhado casaco de lã vermelho. Seus olhos ficaram maravilhados! Queria vesti-lo e sair desfilando para mostrar a conquista da sonhada peça. Por volta das quatro da tarde chegou em casa, carregando a peça, como se fosse uma jóia rara. Resolveu que sairia vestí-lo. Nem se importou com o calor escaldante. Súbito a mãe, viu a adolescente feliz da vida sob o sol escaldante trajando o figurino carmim, embora achasse um absurdo não disse uma palavra. Os olhos da filha brilhavam diante da conquista. O sonho era infinitamente maior do que o calor. Súbito a adolescente aparece na sala com ar de festa transbordando a alegria, os termômetros marcavam vinte e sete graus. A mãe sem saber o que dizer para não estragar o encantamento limitou-se a perguntar: - Vai sair minha filha? Sim – disse Silvia. Vou até o centro dar uma volta. Residiam na periferia. Ä época não havia transporte coletivo do bairro até o centro. Lá se foi a adolescente, feliz da vida. Maquiada como quem iria para a mais nobre das festas. Combinando com o pesado casaco de lã vermelho, calçou o único par de sapatos possuía – branco de salto alto. Caminhava feliz entre os pedriscos, estava acima da temperatura que o dia de verão oferecia. Não enxergava ninguém, vivia o momento de extrema felicidade que o cobiçado casaco lhe proporcionava. Chegando ao centro foi até o jardim na lateral da igreja matriz onde solitária ocupou um dos bancos. Calada, admirava a paisagem, o movimento, as pessoas. Ficou assim por uma hora mais ou menos. Repentinamente se levantou e deu meia volta. Pegou o caminho de casa sem dizer uma palavra, feliz com pelo passeio, irradiante por vestir o casaco de lã vermelho sob o sol escaldante. Ao chegar em casa tirou a preciosa peça com cuidado como quem embala uma criança. Orgulhosa pendurou-a no apertado guarda-roupas. A situação se repetiu por inúmeras vezes. Pleno verão, porém o frio da alma pedia o casaco de lã vermelho. Passaram-se os anos. A adolescente determinada achou o caminho através da disciplina. Hoje, na idade madura poderia ter dezenas de casacos iguais aquele – e todos de grife. Não se importa com isso. Quando as portas da alma se abrem, as lembranças vêm à tona. Nunca se esqueceu do pesado casaco de lã vermelho, que lhe deu tanta alegria, naquela tarde de verão registrada na memória, auge de sua adolescência. (Ana Stoppa) Ana Stoppa
Enviado por Ana Stoppa em 06/02/2011
Alterado em 16/06/2013 Copyright © 2011. Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor. |