Execução Sumária
Logo na entrada do Fórum a extensa pauta das audiências. Conferidos andar e a sala, dois advogados subiram rapidamente com seus clientes para esperar a chamada. O piso de borracha negra contrasta com prateleiras repletas de caixas de papelão, todas transbordando a burocracia - o chamado arquivo morto. Era morto por todos os lados,quer dizer caixas de papelão contendo arquivo morto. Passa por todos uma senhora aparentando uns sessenta anos acompanhada de seu defensor. Porta nas mãos o que parecia inúmeros receituários. Entre a sala das audiências e a de espera divisórias , de modo que se pode ouvir mesmo ser ser curioso tudo o que se conversa . Não demorou, para o que depois foi identificado com a voz da senhora se ouvisse o reclamo. Dizia que serviu o marido por quarenta anos, e que agora que ela estava um bagaço ( disse assim mesmo), doente, ( falando das centenas de receituários misturados com relatórios do INSS indeferindo o Auxilio Doença), havia chutado. E, para que quisesse ouvir arrematava em cada fina de frase. - Aquele desgraçado ficou bem na foto, mais vai quebrar as pernas. Em seguida se ouve um “graças a Deus” . era a mesma senhora agradecendo ao advogado e ao juiz o fato da pensão mensal pedida há mais de dois anos ter enfim sido deferida. Ouve-se a mesma perguntar para o advogado. - Doutor quanto é mesmo o valor que eu vou receber por mês? No que o profissional respondeu quase que sussurrando, prevendo a reação da cliente duzentos reais. O que Doutor,? O que???? Gritou de forma tão intensa que se ouvia no andar inferior. Mais o senhor quer dizer que depois de eu passar, lavar, cozinhar, criar os catorze filhos daquele desgraçado, e ainda por cima obedecendo ao padre, servir na cama sem vontade, agora essa miséria? O Juiz, dotado de bom senso percebeu que a senhora em nada revelava desrespeito e sim um sofrimento que abria diante d Justiça . Pacientemente explicou que o advogado poderia no futuro conseguir melhorar a renda, que por enquanto era aquela mesma. Súbito não se ouve mais nada. De repente, a Senhora recomeça falar. - Olha Seu Doutor Juiz ou Excelência nem sei como chamar o senhor porque eu não tenho escola, quer dizer tenho sim a escola da vida. O senhor me diz pelo amor de Deus como eu vou viver com duzentos reais. Espia só - continuava no solitário protesto. Tenho que comprar remédio de pressão, de depressão, de constipação , outro ainda para o coração, uns outros para dormir . O Senhor sua Excelência vai saber agora - tomo dezessete comprimidos por dia! Depois, preciso comer. O Senhor não come? Então vou comer o que, viver de luz? Ta certo que moro no terreno da prefeitura, mais tenho que pagar a água e luz também. O Senhor não sabe o que è morar no terreno da prefeitura, subir e descer o morro nas ruas de terra. No fim arrematou na maior sinceridade, no mesmo tom de protesto. Seu Doutor o senhor esta ai dono da Justiça sabe disso. Obrigado viu pelo valor que Senhor disse que eu vou receber. Mais só me diz com todo o respeito, o senhor viveria com estA quantia? O Juiz imparcial como determina o procedimento legal, ponderou a pouca leitura da senhora. Nada disse. Saiu da sala desejando para todo o formal boa tarde. Cumpridas as formalidades as partes assinaram a ata. A pobre senhora consolada pelo advogado colocou as digitais. Saiu calada. Ao passar entre o público se via o choro contido, a expressão do sofrimento. De repente saindo da sala de espera ela grita – Olha ! Olha ! Olha! Era uma barata andando calmamente sobre o piso preto. Sob o olhar atônito de todos, a senhora mudando de imediato o chip do humor disparou em alto e bom som: Mais veja, tu barata, tu é aquele desgraçado eu não posso matar senão me prendem. Mais tu eu posso ! - disse antes de pisar com tanta força sobre o inseto que o som ecoou no andar inferior. Extravasou ali sua raiva. Saiu sorrindo do recinto, após executar sumariamente o inseto. Quanto aos dois advogados.... bem, passavam das quinze horas. Pacientemente aguardavam a chamada. A pauta estava atrasada. Na mesa a audiência das doze horas. O expediente se encerraira dezenove horas. Caso não fossem remarcadas as datas sairiam do recinto acompanhados seus seus clientes, portando em mãos o veredicto. (Ana Stoppa) Ana Stoppa
Enviado por Ana Stoppa em 15/02/2011
Alterado em 25/06/2012 Copyright © 2011. Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor. |