Pérolas Tardias Na vitrine iluminada o objeto do desejo - o reluzente colar de pérola de uma volta, rente ao pescoço. A jovem perto dos vinte anos era absolutamente apaixonada pela joia, tão distante de seu minguado bolso. Mesmo assim, aos sábados passava na movimentada via para admirar a peça. Como desejou aquele colar! Doloroso sentimento experimenta a alma quando por alguma razão percebe os sonhos escoar pelos ralos das impossibilidades. Não percebeu o transcorrer do tempo. A determinação, os estudos, o alcance dos objetivos. Transcorridas mais de duas décadas, do nada vieram em sua mente pela porta da saudade que vivia entreaberta, as lembranças do colar de pérolas. Olhou para a penteadeira onde as joias misturadas com as bijuterias brilhavam em meio a dezenas de frascos de perfumes - todos importados. Fios de pérolas, rios de sonhos, fio de vida... A vontade incontrolável de visitar o passado despertou o desejo de visitar a vitrine iluminada onde o singelo colar de pérolas que tanto desejara ficava exposto bem na entrada. Perdeu-se na movimentada via à procura da loja. Ao encontrá-la viu as portas cerradas. Reconheceu o velho jornaleiro da banca ao lado. - Bom dia, o senhor por me dizer se a Loja Oriente fechou? - Ah minha senhora, tem uns três anos que o dono – aquele japonês simpático desistiu dos negócios. A doença o pegou – mal de “Alzheimer”. A última vez que o vi, já debilitado falava coisas desconexas – repetidas vezes mencionava o colar de pérolas, dizia para a filha. - Este você não vende porque ontem a moça de olhos verdes veio aqui, pediu para reservar. - De tanto o pai falar sobre o colar, ao separar o lote de joias destinado para o leilão beneficente, ( desejo da família), separou a peça. - Este não, disse para a irmã. - Assisti tudo dona – continuou o jornaleiro, vi a filha tirar com cuidado o pó para depois guardá-lo na caixinha azul marinho forrada de cetim branco, dizendo para a irmã mais nova: - Nosso pai por tanto tempo esperou a volta da moça de olhos verdes para levá-lo. Toda vez que falava sobre o colar seu olhar brilhava mesclando a esperança com a despedida, era seu desejo vendê-lo para a jovem que por tanto tempo o desejou, só que ela há tanto tempo desapareceu... Quase trinta anos havia se passado... As pérolas? Não mais as deseja, a vida lhe ensinou a descartar o supérfluo. Fechou as cortinas das lembranças, cerrou as janelas da saudade. Cuidadosamente guardou para sempre o colar de pérolas na caixinha dos sonhos forrada do mais alvo cetim. (Ana Stoppa) Ana Stoppa
Enviado por Ana Stoppa em 20/06/2012
Alterado em 20/06/2012 |