Ana Stoppa - Escritas, Versos & Reversos

Se não puder alcançar as estrelas agradeça a Deus por vê-las. (Ana Stoppa)

Textos

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 Sapatilhas Mágicas



 
Quando via as meninas dançar nas apresentações escolares Verônica ficava em um canto.

Geralmente com a criançada que não queria  participar de nada.


Não levava jeito!

Admirava as coleguinhas ágeis, interessadas, enturmadas.

Queria fazer o mesmo, porém estava há pouco tempo naquele colégio.

Se não bastasse isso a timidez impedia.

Ótima aluna, cadernos impecáveis adornados com adesivos.

Que capricho!

Faltava  o lado criança - brincar de roda, amarelinha, passa anel, cirandinha
.

Em casa passava o tempo livre com a única boneca de pano  a quem dera o nome de Laurinha,  presente da Vovó  Anita.

-  Filha, o que vamos fazer no seu aniversário?
Pergunta a mãe  com uns dois meses de antecedência a fim de organizar a festa dos oito anos de  Verônica.

- Mamãe  posso convidar as minhas amiguinhas da escola nova?

A família havia se mudado no início do ano, com isso veio a transferência.

- Claro minha filha, convida sim! 

Chame todos os seus amigos, faremos uma festa linda.


Aproveitamos o espaço do quintal, seu pai faz uma barraca com lona amarela, penduramos  um monte de balões  com uma bonita mesa no centro.

- Mamãe, quero uma mesa de doces, um bolo cor-de-rosa  com uma bailarina bem bonita em cima!
Faremos isso, disse a mãe super  interessada.

Início de inverno,  marcaram para o sábado próximo a compra dos convites.

Verônica fez a lista com os nomes dos amigos da escola anterior, onde apesar de meio tímida estava enturmada – trinta convidados!

Em seguida a relação dos novos amigos, dos primos e das crianças filhas dos conhecidos da família.
Ao todo  oitenta convidados!

Prepararam os convites, na semana seguinte começou a entrega.

Na quarta feira Verônica voltou da escola super feliz.

- Mamãe, hoje a   Professora   Silvia Regina  passou uma poesia tão linda pra gente!

Mamãe a poesia tem um título igual a minha idade – “Meus Oito Anos”, que escreveu foi o Poeta Casimiro de Abreu.

Posso ler para a senhora?

Claro  filha, leia sim!

Verônica  abriu a mochila, pegou o caderno,convidou a mãe para a sala.

- Mamãe, presta atenção que linda esta poesia:

 
MEUS OITO ANOS
 
( Casimiro de Abreu)
 
Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!
Como são belos os dias
Do despontar da existência!
— Respira a alma inocência
Como perfumes a flor;
O mar é — lago sereno,
O céu — um manto azulado,
O mundo — um sonho dourado,
A vida — um hino d'amor!
Que aurora, que sol, que vida,
Que noites de melodia
Naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar!
O céu bordado d'estrelas,
A terra de aromas cheia
As ondas beijando a areia
E a lua beijando o mar!
Oh! dias da minha infância!
Oh! meu céu de primavera!
Que doce a vida não era
Nessa risonha manhã!
Em vez das mágoas de agora,
Eu tinha nessas delícias
De minha mãe as carícias
E beijos de minha irmã!
Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,
Da camisa aberta o peito,
— Pés descalços, braços nus
— Correndo pelas campinas
A roda das cachoeiras,
Atrás das asas ligeiras
Das borboletas azuis!
Naqueles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas,
Brincava à beira do mar;
Rezava às Ave-Marias,
Achava o céu sempre lindo.
Adormecia sorrindo
E despertava a cantar!
................................
Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais!
— Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras
Debaixo dos laranjais!(Casimiro de Abreu)

 

Filha, que poesia maravilhosa!
 
O poeta fala da natureza,  da vida simples, do mar, dos pomares, das flores, da prece e da beleza desta idade.
 
 Muito bonita Verônica!
 
- Ah mamãe, espere quero ler para a senhora  o que a professora ensinou sobre este poeta:

Casimiro de Abreu (1839-1860) foi um poeta brasileiro. Autor de "Meus Oito Anos", um dos poemas mais populares da literatura brasileira. Pertence a segunda geração do romantismo.
Vai com o pai para Portugal, onde inicia sua vida literária. É nesse período que escreve a maior parte dos poemas de seu único livro "Primavera". Escreve a peça "Camões e o Jau", que é encenada no Teatro D. Fernando, em Lisboa. Casimiro é patrono da cadeira nº 6 da Academia Brasileira
de Letras.

Casimiro de Abreu (1839-1860) Nasceu em Barra de São João, Estado do Rio de Janeiro, no dia 4 de janeiro. Era filho do rico comerciante português, José Joaquim Marques de Abreu. Com apenas 13 anos, por ordem do pai, seguiu para o Rio de janeiro, para trabalhar no comércio. Com difícil adaptação, acompanha o pai em viagem para Portugal, em novembro de 1853.
Viveu três anos em Portugal, onde iniciou sua carreira literária e escreveu a maior parte de
seus poemas. No dia 18 de janeiro de 1856, sua peça "Camões e o Jau", é  encenada no Teatro D. Fernando, em Lisboa. Em julho de 1857, volta
para o Brasil e conhece vários intelectuais, faz amizade com Machado de Assis, ambos com 18
anos de idade.

Casimiro de Abreu escreveu pouco, mas, seu
lirismo de adolescente retratado em sua poesia,
que girava em torno do amor, da tristeza da vida, da saudade da Pátria e da saudade da infância,
o tornou o poeta mais popular da literatura brasileira. Seu poema "Meus oito anos" retrata
bem a nostalgia da infância.”...( fonte:www.e-biografias.net).


-Mamãe,  já sei o que quero de presente no meu aniversário

Um  monte de livros!

Muito legal esta poesia!

Adorei saber de Casimiro de Abreu,  filha!


À noite, quando  Renato, o pai retornou do trabalho, após o jantar Verônica leu novamenteo poema.

- Verônica, vai tem um som legal na sua festinha?

Perguntou a amiga Magali.

Ai meu Deus, pensou  - não sei dançar...

Claro  Magali!

O  Jeferson meu primo, vai trazer muitos CDS.


- Filha, amanhã a tia Claudia chega de viagem, disse que comprou seu presente em Viena.

Ontem quando ligou aqui em casa disse que vai trazer antes da festa, pois no dia estará participando de um congresso.

-Tá bom mãeeeeeeeeeee, quero terminar a lição  para brincar com a Laurinha.

Guardou cuidadosamente o material escolar,
correu para o quarto para pegar a boneca.


Dona Cíntia  foi estender as  roupas.

Verônica saiu com Laurinha, foi para os fundos
do quintal para contar as novidades, no  banco
de madeira debaixo da ameixeira.


Conversava com a boneca como se ela entendesse!

Falou da nova escola, das brincadeiras que não participava, do poema de Casimiro de Abreu, da festa e do presente de Viena.

Nos dias seguintes tudo pela festa!

A menina empolgada acompanhava a mãe em cada detalhe.

- Mamãe, a bailarina do bolo quero  vestida de rosa também!

Verônica, a tia Claudia ligou, vem trazer o seu presente.

Uma caixa enorme embrulhada com papel de seda rosa clarinho, adornada por um laço de cetim.

Quando Verônica abriu, que lindo!

Um par de sapatilhas na mesma cor com cetim branco para amarrar...

Ficou maravilhada.

Experimentou...

- Titia, como você acertou, é o meu número!

Correu para se ver no espelho.

Imaginou-se  vestida de rosa, saia de tule armada, meias brancas e as sapatilhas novas.

Ficaria igual à bailarina do bolo.

Tirou as com cuidado, refez a embalagem do presente.

Todas as tardes ao retornar do colégio  experimentava, corria para o espelho.

- Verônica, a Professora Isolda vai fazer uma
nova turma de dança!


Vem fazer parte do nosso grupo!

Joana falou tão empolgada que Verônica,
quebrando a barreira da timidez aceitou o convite.


Faltavam  três semanas para a sua festa.

Do início das aulas até a data fez as contas – oito aulas!

- Filha, olha que collant lindo,  comprei para você!

Achei que você iria gostar.

- Adorei mamãe!

A roupa, da mesma cor das sapatilhas, era  adornada de pedrinhas no decote e nas mangas, acompanhava uma saia de tule branca com várias camadas de babados, como das bailarinas de verdade!

Experimentou com as sapatilhas, perfeito!

Na terceira aula Verônica já aparentava a mudança.

Passava horas ensaiando, queria fazer bonito na festa!


Levava jeito.

Movimentos graciosos completados com o sorriso franco emoldurado pelos cabelos  cor de mel.


- Mamãe, amanhã a Professora Isolda vai pedir a roupa para a apresentação, será um dia antes do meu aniversário!

Disse que todas as meninas tem que estar vestidas  igual.

O empenho da pequena  se traduzia no resultado.

Perfeita nos passos!

Correria geral na semana.

Valeu a pena!

A barraca ficou linda, toda adornada de balões coloridos, no centro a mesa repleta de doces.

A bailarina em cima do bolo, a velinha dos oito anos, Jeferson no som, os convidados chegando!


Alegria geral!

De repente,  chegam as amiguinhas do curso de dança acompanhadas da Professora Isolda – sete meninas  vestidas à caráter.

Verônica vestia uma calça jeans com blusinha rosa.

Isolda entregou um Cd para Jeferson.

- Coloque sua roupa de bailarina Verônica – disse
a professora.


A menina feliz por demais com a surpresa, mais
do que depressa saiu em busca da roupa, das sapatilhas que ganhara da Tia  Claudia.


Dona Cíntia foi ajudar.

Prendeu os cabelos  filha, passou gel com brilho, ajeitou a tiara de pérolas – igual as das amiguinhas,  um pouco de brilho nos lábios, e lá
se foi a menina.


Ao retornar para a festa, a mesa central fora deslocada, os convidados abriram o espaço  para
a dança.


No centro as amiguinhas  graciosamente vestidas, aguardando apenas Verônica para a dança.

A professora havia deixado o lugar do meio para ela.

Encantada com o momento rapidamente ocupou o posto.

Isolda repassou o ensaio – a mesma coreografia  que as meninas haviam dançado no dia anterior – Lago dos Cisnes – Tchaikovsky, Jeferson orientado  ficou atento quando ao momento para liberar o som.

Maravilha!

A apresentação encantou por demais todos os convidados, pediram bis!

Verônica  dançou como nunca!

Nem de longe lembrava a menina tímida que ficava nos cantos da escola.

A dança!

A dedicação, o gosto pelo ballet, o aprendizado rápido, a interação com as amigas, a beleza do traje, a festa impecável, a alegria estampada no rosto de todos os convidados e a magia das sapatilhas cor-de-rosa com laços de cetim branco descortinaram para a pequena  a beleza dos oito anos, como no poema de Casimiro de Abreu.
 
 
(Ana Stoppa) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 



Ana Stoppa
Enviado por Ana Stoppa em 30/06/2012


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