A menina e os vagalumes
Pobre menina, campeava o amor feito vagalumes quando procuram a noite para mostrar o brilho. Árduos caminhos, inúmeras indagações, madrugadas solitárias, vazio, paredes silenciosas emolduravam seus dias. Queria tanto gritar ao mundo que existia, que estava ali esperando a mão amiga, o abraço fraterno, a solidariedade, um sorriso talvez. Mas, os seus dias pontilhados de angústia desconheciam tais sentimentos. Culpa da vida que lhe emprestara a máscara do riso tão perfeita que nem mesmo o mais habilidosos dos mortais conseguiria visualizar a tristeza, a carência, a solidão... Culpa da vida que lhe emprestara a segurança aparente, a altivez no falar, a segurança no decidir, o bom senso acima dos sentimentos que pudessem descortinar sua fragilidade. Vestia-se de alegria, cantava a felicidade, desenhava o amor, aplaudia a paixão, sem no entanto provar estas sensações. Descuidada acabou abrindo as janelas da esperança de há muito emperradas em razão do desuso. Acordou na primavera, ruas floridas, sol a brilhar, pessoas felizes caminhando de mãos dadas, crianças brincando e o amor fazendo ciranda sob o ritmo da paz. Amedrontada ousou deixar a máscara na mesinha lateral, saiu de cara nua, peito aberto. Misturou-se à multidão na esperança de encontrar o amor. Nem pedia muito, bastaria um demorado abraço sincero. Em meio à multidão sentiu-se ignorada, rostos opacos, semblantes desfigurados pessoas indiferentes. Precisava da máscara do riso para suportar as lágrimas que brotaram aos borbotões de sua alma. Quando preparava-se para retornar ao casulo, sentiu nos ombros o toque da mão amiga. Virou-se delicadamente quando um par de olhos aparentemente inocentes lhes fitavam. Estendeu os braços, pediu um abraço, procurou abrigo, precisava de colo. Abriu o coração de tal forma que se desconheceu, e sem pensar deixou nascer no peito a frágil planta da ternura. Em tão poucas luas assistiu feliz a transformação da realidade, acreditou no amor, teceu planos, sepultou os desenganos. Entregou a alma nua por inteiro e nos braços do primeiro amor, vivenciou a afeto, a paz e o carinho que tanto buscara, experimentou a fugaz felicidade. Passados alguns dias a serenidade encolheu feito lua minguante. decepcionante. Um gesto, uma palavra, a desconfiança. Lamentavelmente as pessoas não estão habituadas à serem bem tratadas. Despida da máscara do riso, entregue de alma nua, ouviu o grito da realidade, sua bondade fora taxada de vulgaridade, havia se exposto demais por conta da carência afetiva. Na calada da noite provou o sal das densas lágrimas, mal conseguia caminhar. Com resquícios de forças despediu-se do amor, cerrou as janelas, vestiu em definitivo a máscara do riso, secou de vez todas as lágrimas, estampou no andar a segurança própria das pessoas indiferentes. Como último gesto, apagou uma a uma a luz dos vagalumes... Ana Stoppa Ana Stoppa
Enviado por Ana Stoppa em 06/10/2013
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